(DES)DIBUJAR FRONTERAS / INAUGURAR FRONTERAS

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2 - CIAUD / FA-ULisboa: À flôr-da-pele: Desenho e Representação da Cidade


Veja vídeo do workshop:




2.            No C.I.A.U.D; Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa (FA/U.Lisboa)
Título:
“À FLÔR-DA-PELE: Desenho e Representação da Cidade”
Professores Responsáveis:
Pedro António Janeiro; Ivo Covaneiro (Monitor do Workshop)
Instituição:
Projecto de Investigação ARQUITECTURAS IMAGINADAS, Representação Gráfica Arquitectónica e Outras-Imagens, C.I.A.U.D.; FACULDADE DE ARQUITECTURA, UNIVERSIDADE DE LISBOA, F.A.U.Lisboa
Local:
Bairro Alfama, Lisboa
Duração:
24 horas
Data e horário do WS:
14 de novembro de 2015, ínicio às 10h00
Público alvo:
Alunos de Arquitectura, Urbanismo e Design
Vagas disponíveis:
20 vagas

Resumo da proposta:

[O Workshop À Flôr-da-Pele: Desenho e Representação da Cidade é um trabalho de campo do Projecto de Investigação ARQUITECTURAS IMAGINADAS, Representação Gráfica Arquitectónica e Outras-Imagens, C.I.A.U.D.; FACULDADE DE ARQUITECTURA, UNIVERSIDADE DE LISBOA, F.A.U.Lisboa.]
Desenha-me um pássaro a sépia com uma linha
Na concha que é as palmas das minhas mãos,
Que voe mais alto que a Pintura,
Que não tenha medo quando a pique,
Que da ilusão faça elmo,
Que por príncipe me tome
Como por tão certo
Este todo o meu sangue
Opalino feito em pedra.
Um tronco que acho
Numa praia de prodígios
Em tudo semelhante a um touro num lugar pagão:
Em negros,
Brancos que arrepiam
E cinzas de carne humana sem cheiro,
Sem nada, entre lilases.
Sabe-me a sangue a boca
Por tanta a saudade,
Por ver desesperadas crianças como eu fui
A um canto
A imaginar o mundo
Na mais suprema certeza de não terem sequer existido,
À espera
Que o estoque as fira,
Mas sem doer,
No centro do centro
Daquilo que faz com que os seus olhos vejam
Enquanto choram flores
Sob um tecto de nuvens que enrolam densas
Gritos de anjos
A quem foram queimados, a poder de lume,
Os olhos
Porque me alimento do fundo que o mundo me dá.

O desenho é um objecto. Desenhar é aumentar o mundo.
Lembro-me de uma criança que desenhava no chão com um pincel e água num pátio de cimento afagado. Com água ia dizendo com linhas e manchas pássaros, casas, paisagens; desenhava o que via; inventava mitologias privadas; apontava para o desenho e dizia “Sou eu”. Quando o desenho era grande, subia a uma nespereira sobranceira ao pátio para ver o desenho de cima. Um dia, deslumbrado com o que via enquanto chamava “eu” àquilo que via, caiu e partiu o braço. No dia seguinte a árvore não estava lá: tinha sido cortada rente à terra. Esta imagem sempre me impressionou.
Lembro-me do Piotr: Piotr era um boneco animado polaco, inteligente, mas muito alegre. O Piotr do cão amarelo, que sempre que enfrentava algum perigo lhe aparecia um duende que lhe emprestava “o lápis mágico”. O lápis com que Piotr desenhava no chão tinha a capacidade de materializar tudo o que Piotr desenhava ou desejava: se um par de asas brancas, Ícaro; se um barco à vela, navegador; se uma praia, náufrago.
Lembro-me dos desenhos feitos com o dedo no sujo dos capots dos carros; nos vidros embaciados.
Lembro-me dos desenhos com uma pedra de giz no negro do asfalto; a mão de um homem impressa ou soprada a ocre nas paredes de Lascaux.
Um desenho al vif, entre outras coisas, é uma espécie de fragmento que eu recorto e roubo à realidade.
Desenhar é um roubar lícito: porque aquilo que o desenho rouba, devolve-o ele próprio em dobro, ou em mais, à realidade roubada. O produto do meu saque é mais um objecto no mundo: o meu desenho é o meu roubo e a minha entrega. Digo que tiro, mas sei que dou.
Se desenho sobre um papel, roubo e trago a realidade roubada debaixo do meu braço.
Interessante seria se esse desenho que faço daquilo que digo que vejo fosse abandonado na própria cena do crime; se esse desenho, que é mais um objecto no mundo, fosse alimentar essa realidade que consente ser roubada pelos olhos (para que os outros quando a vissem, a vissem também através de um seu desenho; ou, se a desenhassem, a desenhassem desenhando também o meu desenho) – isto no caso do suporte escolhido ser uma superfície imóvel como uma parede, o asfalto, o vidro de uma janela, etc; ou ainda, de um outro modo, interessante seria, se o suporte escolhido for móvel, como o capot de um automóvel ou uma folha de árvore, o desenho construido pudesse viajar para longe daqui dando a conhecer o aqui-roubado. Mas porque não sobre o papel?
Porque o papel obriga-me a enquadrar aquilo que eu vejo segundo critérios preestabelecidos pela sua dimensão e pelo seu formato standartizado. Se eu não desenhar sobre o papel tenho o mundo inteiro para construir o meu desenho, sem limites. A dimensão, a escala a que desenho, escolho-as eu.
O papel antes mesmo do desenho ser desenho, já o predica. O quadrado e o rectângulo querem ser expostos.
O meu desenho é a ponte estreita sob o precipício que me separa das coisas. Só por isso vale a pena desenhar porque desenhar é esticar o corpo e tocar nas coisas, elas mesmas como vividas por mim em mim.
Talvez por isso eu hoje em dia tenha escolhido as palmas das minhas mãos e a minha própria pele como suporte do meu desenho. Sem o papel como suporte ou outra superfície, ganho mais: ganho aquela espécie de sedução que quem desenha conhece quando se sente o confronto da ponta do lápis ou da esferográfica com a superfíce que se ataca. Desenho assim em dobro porque sinto o desenho a acontecer na mão que desenha e na mão que consente o desenho. O meu corpo é o meu princípio e o meu fim, o meu desenho a minha ressurreição.

MATERIAIS:
Canetas de gel de várias espessuras, pincéis, aguarelas, etc.

Fundamental: máquina fotográfica.

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